Arte ajuda na ressocialização

Folha de Londrina | 29 de novembro de 2008

O encerramento das aulas de Arte desenvolvidas no Centro de Sócio-educação (Cense) Joana Miguel Richa foi marcado por um encontro que promoveu uma reflexão sobre a liberdade. De um lado, o artista paranaense Rogério Dias, 63 anos, conhecido por representações de pássaros em suas obras. De outro, as adolescentes privadas de liberdade que cumprem medidas sócio-educativas na unidade.

Para mostrar os trabalhos criados nas oficinas, as adolescentes realizaram uma apresentação que uniu as práticas das aulas de artes visuais, teatro e dança. Nas paredes do antigo convento, foram expostas várias obras criadas pelas jovens, releituras de artistas do Renascimento, Barroco e Arte Moderna, como Leonardo da Vinci, Vincent Van Gogh, Salvador Dali, Romero Britto e o também paranaense Poty Lazzarotto, que formam um acervo de aproximadamente 500 trabalhos.

A expressão artística é um dos fatores que ajudam na ressocialização das adolescentes e em seu desenvolvimento como pessoas. A evolução das meninas é facilmente percebida, como conta a educadora de artes visuais Herotides Aparecida dos Reis. ”É maravilhoso, elas se socializam e conhecem os artistas. É um estímulo.” A atividade é aprovada por jovens como a adolescente Aline (nome fictício), 18, que está na unidade há um ano. ”Me ajuda no auto-controle, eu fico calma, me sinto bem, uma nova pessoa. É uma paixão, me orgulho do que faço”, afirma.

Os temas trabalhados pelos artistas e preferidos pelas adolescentes são aqueles que interferem diretamente em seus cotidianos: as flores e os pássaros. ”As flores são sensíveis, coloridas”, explica Aline.

As meninas, que sonham diariamente com a chegada da liberdade e a saída do Cense, encontraram nas obras de Dias uma identificação com seu maior sentimento. Aline já havia ”escutado falar” sobre Rogério Dias quando ainda frequentava a escola em sua cidade natal, Jacarezinho, e conheceu mais a sua obra quando chegou na unidade. Para ela, Dias representa a liberdade na maneira como desenha os pássaros. ”Quando eles (os pássaros) estão flutuando, com as asas abertas. Não tem solidão, só amor”, analisa emocionada. ”Aqui é uma prisão carnal, não interior. Sou totalmente livre para fazer o que quiser, no meu pensamento”, afirmou a jovem, que se imagina junto com a família e nos lugares onde mais gosta de estar.

Dias, que também é pintor, desenhista, escultor, desinger gráfico, cartunista, ator e ilustrador, se sentiu agradecido pelo carinho. Ele disse que a participação em encontros com o público ainda é uma novidade para ele. ”Estou descobrindo um mundo novo, sempre fico mais no meu ateliê”, contou. ”Elas devem verificar o tempo, pois mais tarde vão lembrar daqui com carinho. Aqui ela estão protegidas e a liberdade um dia vem”, referiu-se às adolescentes.

Aline aproveitou o momento da entrevista para também fazer uma pergunta ao artista. Sua curiosidade era em relação ao tema de suas obras, os pássaros. ”Você já se sentiu preso de alguma forma, o que o motiva a desenhar pássaros? Isso me afeta.” Dias respondeu contando sobre seu amor pela arte. ”É uma compulsão de pintar, preciso de um tema, os pássaros são uma desculpa”, argumentou. ”Essa foi a melhor resposta que você poderia me dar”, agradeceu a jovem.